BANHO QUE TE QUERO SEMPRE

Cristian Luis Hruschka
AJZENBERG, Bernardo. Minha vida sem banho. Rio de Janeiro: Ed. Rocco, 2014, 189 pág.
Temos o hábito de nos banhar todos os dias, mais de uma vez. O Brasil é um país muito quente e o suor atrapalha no dia a dia. Esse hábito vem dos índios e, por mais que os europeus tenham se empenhado, não conseguiram acabar com ele. Hoje, porém, a água tem se tornado um bem cada vez mais escasso e precioso. As campanhas de conscientização têm sido cada vez maiores, também pudera, escovando os dentes por cinco minutos gastamos doze litros de água; um banho de quinze minutos consome 135 litros, sem levar em consideração o tempo que os homens desperdiçam para fazer a barba sob o chuveiro; uma torneira pingando por todo o dia elimina algo em torno de quarenta e cinco litros. É justamente o gasto exagerado de água que serve de mote para o novo livro de Bernardo Ajzerberg, dando início a uma trama que leva o leitor para períodos conturbados da história recente da humanidade.
Em "Minha vida sem banho", o narrador principal, Célio, não consegue tomar seu banho por um problema na resistência do boiler, possivelmente um curto circuito. Como trabalha em um instituto que "analisa o consumo desenfreado e irresponsável da água", decide iniciar um Projeto e não tomar mais banho, envolvendo-se em diversas situações que o levam a sentir-se constrangido pelo odor exalado.
Sua saga sujismunda, porém, é intermeada por outros narradores que deixam a história ainda mais interessante. Em capítulos que os alternam, Célio dá espaço para que outras pessoas contem parte de sua história, entre elas seu pai, Waisman, e o advogado Wiesen. Ambos são colegas e passaram juntos pelo regime militar. A vida de Waisman, revolucionário, jornalista que atravessa uma crise de meia-idade, contrasta com a de Weisen, que constrói uma carreira sólida na advocacia. Entre eles está Flora, mãe de Célio, peça principal de um triângulo amoroso que toma desdobramentos curiosos após Célio receber de Weisen um caderno com anotações que o faz imergir "na história triste e infectada de rancores e ressentimo mútuo" dos seus pais.
Alternando-se os narradores, o que por vezes acaba deixando de lado a questão da "vida sem banho" do personagem principal, a história também transita pela Segunda Guerra Mundial e a questão judaica, esta relacionada ao avô de Célio, ou Celito, como é chamado pela sua namorada, que envia-lhe cartas e mensagens da cidade de Manaus, estranhando seu comportamento e demonstrando a fragilidade do relacionamento.
Confesso que na livraria não procurava pelo livro de Ajzenberg, contudo, fui atraído para ele como rato pelo queijo. A edição é muito bonita, capa bem acabada e um livro de excelente manuseio. Também já havia lido sobre seu lançamento e não resisti à tentação. Boa surpresa! Ótimo para ler após um banho quente.
Trecho:
"Há pessoas nascidas para a descontinuidade. Não conseguem chegar até o fim: ou se apressam e capotam no meio do trajeto, ou se deixam tomar pela ansiedade e sufocam. Penso muito na paciência e na perseverança dos maratonistas ou na calma e autoconfiança dos nadadores de longos percursos, aquelas pessoas que avançam devagar numa piscina, indo e voltando, sempre cientes de que chegarão ao seu destino, mantendo a velocidade e o ritmo das braçadas, sabendo que cumprirão aquilo que tinham se proposto a fazer. É uma grande qualidade. Começar algo, em qualquer terreno que seja, pode ser fácil. O mais difícil é saber sustentar isso, levar até o fim. Eis, na verdade, o maior dos desafios, ao menos para mim" (pág. 160).
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CRISTIAN LUIS HRUSCHKA, responsável pelo site www.resenhas-literarias.blogspot.com.br. É autor do livro "Na Linha da Loucura", publicado em 2014 pela editora Minarete/Legere (www.facebook.com.br/nalinhadaloucura). E-mail: clhadv@hotmail.com

Cristian Luis Hruschka
AJZENBERG, Bernardo. Minha vida sem banho. Rio de Janeiro: Ed. Rocco, 2014, 189 pág.
Temos o hábito de nos banhar todos os dias, mais de uma vez. O Brasil é um país muito quente e o suor atrapalha no dia a dia. Esse hábito vem dos índios e, por mais que os europeus tenham se empenhado, não conseguiram acabar com ele. Hoje, porém, a água tem se tornado um bem cada vez mais escasso e precioso. As campanhas de conscientização têm sido cada vez maiores, também pudera, escovando os dentes por cinco minutos gastamos doze litros de água; um banho de quinze minutos consome 135 litros, sem levar em consideração o tempo que os homens desperdiçam para fazer a barba sob o chuveiro; uma torneira pingando por todo o dia elimina algo em torno de quarenta e cinco litros. É justamente o gasto exagerado de água que serve de mote para o novo livro de Bernardo Ajzerberg, dando início a uma trama que leva o leitor para períodos conturbados da história recente da humanidade.
Em "Minha vida sem banho", o narrador principal, Célio, não consegue tomar seu banho por um problema na resistência do boiler, possivelmente um curto circuito. Como trabalha em um instituto que "analisa o consumo desenfreado e irresponsável da água", decide iniciar um Projeto e não tomar mais banho, envolvendo-se em diversas situações que o levam a sentir-se constrangido pelo odor exalado.
Sua saga sujismunda, porém, é intermeada por outros narradores que deixam a história ainda mais interessante. Em capítulos que os alternam, Célio dá espaço para que outras pessoas contem parte de sua história, entre elas seu pai, Waisman, e o advogado Wiesen. Ambos são colegas e passaram juntos pelo regime militar. A vida de Waisman, revolucionário, jornalista que atravessa uma crise de meia-idade, contrasta com a de Weisen, que constrói uma carreira sólida na advocacia. Entre eles está Flora, mãe de Célio, peça principal de um triângulo amoroso que toma desdobramentos curiosos após Célio receber de Weisen um caderno com anotações que o faz imergir "na história triste e infectada de rancores e ressentimo mútuo" dos seus pais.
Alternando-se os narradores, o que por vezes acaba deixando de lado a questão da "vida sem banho" do personagem principal, a história também transita pela Segunda Guerra Mundial e a questão judaica, esta relacionada ao avô de Célio, ou Celito, como é chamado pela sua namorada, que envia-lhe cartas e mensagens da cidade de Manaus, estranhando seu comportamento e demonstrando a fragilidade do relacionamento.
Confesso que na livraria não procurava pelo livro de Ajzenberg, contudo, fui atraído para ele como rato pelo queijo. A edição é muito bonita, capa bem acabada e um livro de excelente manuseio. Também já havia lido sobre seu lançamento e não resisti à tentação. Boa surpresa! Ótimo para ler após um banho quente.
Trecho:
"Há pessoas nascidas para a descontinuidade. Não conseguem chegar até o fim: ou se apressam e capotam no meio do trajeto, ou se deixam tomar pela ansiedade e sufocam. Penso muito na paciência e na perseverança dos maratonistas ou na calma e autoconfiança dos nadadores de longos percursos, aquelas pessoas que avançam devagar numa piscina, indo e voltando, sempre cientes de que chegarão ao seu destino, mantendo a velocidade e o ritmo das braçadas, sabendo que cumprirão aquilo que tinham se proposto a fazer. É uma grande qualidade. Começar algo, em qualquer terreno que seja, pode ser fácil. O mais difícil é saber sustentar isso, levar até o fim. Eis, na verdade, o maior dos desafios, ao menos para mim" (pág. 160).
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CRISTIAN LUIS HRUSCHKA, responsável pelo site www.resenhas-literarias.blogspot.com.br. É autor do livro "Na Linha da Loucura", publicado em 2014 pela editora Minarete/Legere (www.facebook.com.br/nalinhadaloucura). E-mail: clhadv@hotmail.com
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