Pular para o conteúdo principal

"Na Linha da Loucura", Cristian L. Hruschka


HRUSCHKA, Cristian Luis. Na Linha da  Loucura, Balneário Camboriú: Ed. Minarete/Legere, 2014, 87 p.

"A leitura de 'Na Linha da Loucura' constitui uma caixa de surpresas. É que a novela de Cristian Luis Hruschka, no aspecto formal, revela um escritor feito e que domina seu instrumento de trabalho sem incidir nos notórios defeitos comuns aos iniciantes. Embora este seja seu livro de estreia, mostra que o autor vem se exercitando de muito tempo na difícil arte da escrita literária. A impressão que fica é a de que ele escreve com facilidade e o texto flui de maneira livre, com aquela naturalidade de quem sabe com precisão o que e como deseja dizer. O estilo é simples, límpido e direto, sem rebuscamentos desnecessários.

A história se desenrola na sequência de surpresas. Cada tópico contém, por assim dizer, algum imprevisto que provoca impacto no leitor e atiça sua curiosidade, prendendo-o na leitura, até o final. E nisso se revela a criatividade do autor. Os fatos reais e os imaginários se cruzam e entrecruzam, às vezes no mesmo plano, em outras bem definidos, mas sempre de maneira envolvente e sem cortes bruscos ou hiatos que possam diminuir o interesse pela narrativa. E assim transcorre a curiosa história, do começo ao fim, num texto bem construído e observando um desenvolvimento lógico até o inesperado desfecho.

Outro aspecto a merecer destaque é a pintura dos ambientes onde se desenvolvem certas cenas da narrativa. É admirável a fidelidade com que o autor reproduz o clima asfixiante que reina no meio sórdido da jogatina e das atividades criminosas que costumam cercá-lo. Faz o leitor ansiar pela mudança de local, procurando um meio em que haja ar puro e luminosidade que afastem a sensação opressiva de iminente perigo. É com visível alívio que vence essa etapa da narrativa, tal como o sente o personagem nela envolvido e como pretendia o autor.

Também os personagens são desenhados com perícia, tanto aqueles que não estão envolvidos no crime e na violência como os que penetram nesse meio à revelia. São figuras debuxadas em poucas linhas, cujas características pessoais vão surgindo ao longo da narrativa. Certos indícios, a exemplo das manchas de sangue no jaleco do médico e a cicatriz na face de um dos jogadores parecem assinalar o caráter criminoso e repulsivo de certas figuras. Funcionam como marcas profissionais. Enquanto isso, o personagem central constitui o retrato da perplexidade e da impotência diante da situação absurda que o envolve de maneira invencível e contra a qual se debate na triste solidão da qual ninguém pode tirá-lo.


A leitura da novela de Cristian Luis Hruschka é uma experiência envolvente, levando o leitor a viver com intensidade cada um de seus momentos e conduzindo-o a um desenlace inesperado e impactante que, sem dúvida, permanecerá indelével na memória. Vale a pena."

ENÉAS ATHANÁZIO - escritor e crítico literário catarinense.

Comentários

  1. Boa tarde.
    Muito boa a resenha. Fiquei com muita vontade de ler!
    Entrei no Facebook e vi, além de ser seu primeiro livro, o mesmo tem pouco tempo que foi publicado.
    Temos algo em comum, pois recebi meu primeiro livro esse semana e é indescritível a sensação de ter o primeiro exemplar na mão.
    Caso tenha interesse, dê uma passadinha no meu blog www.cobramiuda.blogspot.com , onde deixei o primeiro capítulo para download.
    De qualquer forma, não escrevi para fazer propaganda e sim para dar os meus parabéns.
    Sucesso!

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Outras postagens ✓

"Onde os velhos não têm vez", Cormac McCarthy

SANGUE E VIOLÊNCIA NA FRONTEIRA Cristian Luis Hruschka   McCARTHY, Cormac. Onde os velhos não têm vez , 2ª ed., Rio de Janeiro: Alfaguara, 2023, 229 páginas (Tradução: Adriana Lisboa).   Visceral! Lançado em 2005, o romance “Onde os velhos não têm vez”, de Cormac McCarthy, é violento, direto e sensacional. Falecido em junho de 2023, McCarthy é considerado um dos maiores escritores norte-americanos dos últimos tempos. Ficou conhecido por romances com alto grau de violência e economia de detalhes. O livro “Onde os velhos não têm vez”, reeditado pela Ed. Alfaguara, é prova disso. Ambientado no Texas, na divisa com o México, a trama avança com velocidade, narrando a fuga de Llwelyn Moss (veterano do Vietnã) do “carniceiro” Anton Chigurh, o qual, por sua vez, é perseguido pelo xerife Ed Tom Bell, já com certa idade e desanimado com o aumento da violência na região. Tudo começa quando Moss, durante uma caçada na região árida próxima ao México, se depara com o resul...

"O Mundo de Platão", Neel Burton

O FILÓSOFO ESCRITO   BURTON, Neel. O Mundo de Platão, Ed. Cultrix, 2013, 231 páginas. Tradução de Mario Molina. Muito já se escreveu sobre o filósofo grego Platão, porém, poucas obras reúnem de forma concisa e clara seus diálogos e apresentam um panorama do ambiente em que ele viveu há mais de 20 séculos. O livro escrito pelo inglês Neel Burton apresenta uma proposta diferenciada, abordando a história de Atenas até a elaboração dos famosos diálogos de Platão. Nessa trajetória consegue integrar o leitor ao ambiente da época, familiarizando-o com palavras e expressões muito utilizadas mas pouco compreendidas pelo grande público. De forma suscita, porém objetiva, explica questões pontuais da história como o surgimento da “Cidade-Estado”, as guerras persas com o famoso Leônidas e seus trezentos heróis espartanos, e as guerras do Peloponeso, que resultou no controle de Atenas, rendida, por Esparta. Além do contexto histórico, Burton apresenta os filósofos mais importantes da ép...

"Mossad - Os Carrascos do Kidon", Eric Frattini

EM NOME DE ISRAEL Cristian Luis Hruschka FRATTINI, Eric. Mossad os carrascos do Kidon: a história do temível grupo de operações especiais de Israel. 1a. Ed., São Paulo: Ed. Seoman, 392 pág. Referenciado por uns e considerado por outros como sendo um grupo terrorista de Israel, o Mossad consiste no mais avançado e treinado serviço de investigação israelense. Criado em 1951, teve como proposta inicial vingar os judeus mortos durante a Segunda Guerra Mundial, aproximadamente seis milhões, e combater os inimigos de Israel em todo e qualquer lugar do planeta. O "Kidon", por sua vez, é a unidade "secreta"do Mossad, este vinculado ao Metsada, responsável pelas operações especiais de Israel. Sua norma básica de atuação é: "Não haverá matança de líderes políticos; estes devem ser tratados através dos meios políticos. Não se matará a família dos terroristas; se seus membros se puserem no caminho, não será problema nosso. Cada execução tem de ser autoriza...

"O Caminho do Peregrino", Laurentino Gomes e Osmar Ludovico

VISITA À TERRA SANTA Cristian Luis Hruschka GOMES, Laurentino; LUDOVICO, Osmar. O Caminho do Peregrino: seguindo os passos de Jesus na Terra Santa , 1ª ed., São Paulo: Globo, 2015, 198 páginas (Ilustrações: Cláudio Pastro).   Imagine-se em uma praia, à frente de um pequeno barco e com a rede vazia de peixes. Uma pessoa se aproxima e diz para você entrar no mar e lançar novamente a rede que muitos peixes virão e que a partir daquele momento você não deve mais pescar peixes, mas sim homens! Essa pessoa também se intitula filho de Deus, tendo nascido de uma virgem. Você largaria tudo para segui-lo? Nos dias atuais, com recursos tecnológicos à palma da mão, dificilmente você acreditaria em alguém com esse discurso, porém, há dois mil anos, Jesus Cristo se mostrou para a humanidade e cativou seguidores com sua simplicidade, amor e palavras de esperança. O mundo depois Dele nunca mais foi o mesmo. Em um livro curto, Laurentino Gomes, mais conhecido por "1808" e "1822...

"O Útimo Homem Branco", Mohsin Hamid

PROMETE MAS NÃO ENTREGA Cristian Luis Hruschka   HAMID, Mohsin. O Último Homem Branco , São Paulo: Companhia das Letras, 2023, 134 páginas (Tradução: José Geraldo Couto).   Lançado em 2022, o livro de Mohsin Hamid foi recebido como um sucesso de crítica. Nascido no Paquistão, o escritor já viveu na Califórnia, Nova Iorque e Londres, sendo colaborador de jornais como The New York Times e Washington Post. O livro conta a história de Anders, um homem branco que, em certa manhã, ao acordar, “descobriu que tinha adquirido uma profunda e inegável tonalidade marron”. A temática proposta é muito inteligente e gera controvérsias das mais variadas, principalmente quanto à intolerância racial. Escrito de maneira arrastada, o livro não prende o leitor e, na minha singela opinião, assim segue até o final. A ideia de abordar uma questão tão importante, com grande clamor social e por muitos tida como apavorante por colocar em xeque a “supremacia do homem branco”, que estaria ...

"Ontem à Noite era Sexta-feira", Roberto Drummond

PASSEIO POR BH Cristian Luis Hruschka DRUMMOND, Roberto. Ontem à noite era sexta-feira, 4a. ed., Rio de Janeiro: Ed. Guanabara, 1988, 210 p. O teólogo holandês Erasmo de Roterdã disse: "quando tenho algum dinheiro, compro livros. Se ainda me sobrar algum, compro roupas e comida" . Nos dias atuais essa expressão pode ser quase levada ao pé da letra quando visitamos os diversos sebos que existem pelo Brasil. Neles é possível garimpar livros muito interessantes e há tempo fora de catálogo. Bom frequentador desses locais, perdendo horas vasculhando as estantes, ao trocar créditos recebidos em um sebo por outros livros, encontrei "Ontem à noite era sexta-feira", de Roberto Drummond. Ler Drummond é sempre uma satisfação. Na linha dos bons escritores mineiros, tal como Fernando Sabino e Oswaldo França Júnior, possui uma escrita rápida, simples e profunda, qualidades literárias somente alcançadas com muito esforço. Sabino, em sua famosa entrevista ao programa Roda Vi...

"Depois do Último Trem", Josué Guimarães

LITERATURA RECOMENDADA Cristian Luis Hruschka GUIMARÃES, Josué. Depois do Último Trem, 2a. ed., Porto Alegre: Ed. L & PM, 1979, 141 pág. O Estado do Rio Grande do Sul sempre apresentou ótimos escritores. Érico Veríssimo na prosa e Mário Quintana na poesia, com certeza os maiores representantes. Outros estão meio esquecidos, mas suas obras não podem ser deixadas de lado. Josué Guimarães é um deles. Nascido na cidade de São Jerônimo (RS), teve uma vida movimentada. Trabalhou em diversos jornais de âmbito nacional, sendo perseguido durante o regime militar, quando esteve na clandestinidade escrevendo por meio de pseudônimos. Falecido em 1986, deixou um grande número de obras, adultas e infantis. Seus livros de maior expressão são "Enquanto a noite não chega", reconhecido pela crítica como obra máxima, "Dona Anja", "Tambores Silenciosos" e "Camilo Mortágua". Lembrei de seu nome quando estava lendo o artigo do Alberto Mussa no suplemento ...

"Flores para Algernon", Daniel Keys

INTELIGÊNCIA ILIMITADA? Cristian Luis Hruschka   KEYS, Daniel. Flores para Algernon . São Paulo: Aleph, 2018, 288 páginas (Tradução: Luisa Geisler).   Eis mais um livro que por diversas vezes tive nas mãos mas algo me falava para não comprar. Como se conversasse comigo, dizia: - calma, ainda não chegou o momento!   Anos passaram e, circulando pelo site da Amazon, deparo novamente com o livro de Daniel Keys. Como estava na minha lista de sugestões, apareceu mais um atrativo, desconto de 39% e entrega pela Prime, ou seja, grátis para mim. Comprei!   O livro chegou e novamente conversou comigo: - já estou aqui, mas ainda não é a hora!   E assim foi por mais cinco meses, até que comecei a ler Flores para Algernon , uma obra-prima da ficção científica e da literatura contemporânea.   Narrado em primeira pessoa, mostra a evolução de um homem com problemas intelectuais que, submetido a um experimento, desenvolve aptidões fantásticas, retr...

"Perguntaram-me se Acredito em Deus", Rubem Alves

REFLEXÕES DE RELIGIOSIDADE Cristian Luis Hruschka PERGUNTARAM-ME SE ACREDITO EM DEUS, Rubem Alves, Ed. Planeta, 2007, 176 p. Psicanalista, educador e autor de diversos livros infantis e sobre religião, Rubem Alves é ainda cronista do jornal Folha de São Paulo. Em seus recentes textos destaca-se a discussão que levantou a respeito da eutanásia: “A vida só pode ser medida por batidas do coração ou ondas elétricas. Como um instrumento musical, a vida só vale a pena ser vivida enquanto o corpo for capaz de produzir música, ainda que seja a de um simples sorriso. Admitamos, para efeito de argumentação, que a vida é dada por Deus e que somente Deus tem o direito de tirá-la. Qualquer intervenção mecânica ou química que tenha por objetivo fazer com que a vida dê o seu acorde final seria pecado, assassinato.” (Folha, 08.01.2008, pág. C2). Em outro artigo, no mesmo jornal, Rubem Alves destaca: “Muitos dos ‘recursos heróicos’ para manter vivo um paciente são, no meu ponto de vista, um...

"O Espião que Saiu do Frio", John le Carré

O REI DA ESPIONAGEM Cristian Luis Hruschka LE CARRÉ, John. O Espião que Saiu do Frio, 8a. Ed., Rio de Janeiro: Ed. Record, 2013, 237 páginas. Tradução: Adelino dos Santos Rodrigues. Britânico, nascido em 1931, John le Carré é um dos maiores escritores do gênero de espionagem. Seu primeiro livro (O Morto ao Telefone) foi lançado em 1961, quase duas décadas após o término da segunda guerra mundial. Integrante do corpo diplomático da Inglaterra, Le Carré trabalhou por muitos anos na Alemanha, em plena guerra fria, sendo boa parte de seus romances ambientados nessa época.  O Espião que Saiu do Frio  é de 1963, quando livros de espionagem faziam muito sucesso impulsionados pelo conhecido James Bond, de Ian Flemming. O agente de Le Carré, porém, é bastante diferente do 007. Muito mais introspectivo e reservado, sem fazer uso de armas espalhafatosas e fantasiosas, o personagem Alec Leamas foi criado com muita técnica e perfeição. Seus diálogos são milimetricamente ...