DELITOS LITERÁRIOS
BARTLETT, Allison Hoover. O Homem que Amava muito os Livros: a história real de um ladrão bibliófilo, um detetive e os bastidores do universo dos colecionadores literários, São Paulo: Ed. Seoman, 2013, 208 páginas, tradução: Drago.
BARTLETT, Allison Hoover. O Homem que Amava muito os Livros: a história real de um ladrão bibliófilo, um detetive e os bastidores do universo dos colecionadores literários, São Paulo: Ed. Seoman, 2013, 208 páginas, tradução: Drago.
No início do livro a autora avisa: "Sempre costumo associar o aroma de um livro antigo à época em que ele tenha sido escrito, como se a fragrância fosse diretamente proveniente da ambientação da história que é narrada." (pág. 10). Por esse pequeno trecho podemos deduzir que para muitas pessoas o mais importante não é o que está dentro do livro, mas sim o que ele representa no tempo e no espaço. Livros antigos são sinônimo de lutas, de idéias, inovações. Essa paixão pelo livro como um objeto que representa emoções e lembranças, somada ao prazer de manter o exemplar em sua biblioteca, é cultivada pelos bibliófilos, amantes de livros belos e raros que muitas vezes os coleciona em virtude de circunstâncias ligadas à sua publicação, geralmente estudando-os.
Em "O homem que amava muito os livros", Allison Bartlett nos conta a vida de um bibliófilo. Seu nome é John Gilkey e ele rouba livros para sua coleção.
Pessoa de poucos recursos mas apaixonada por livros raros, especialmente as primeiras edições, John Gilkey passou a roubá-los para sustentar seu vício. Ainda que no Brasil não seja um setor lucrativo, até mesmo em razão do pouco interesse da população e a dificuldade de acesso dos leitores à livros e autores, seja pela pequena quantidade de bibliotecas ou do alto valor das edições nas livrarias, nos Estados Unidos são inúmeros os antiquários que comercializam livros raros. Os golpes de Gilkey normalmente ocorriam através da utilização do número de cartão de crédito de terceiros, clientes de uma loja em que Gilkey era vendedor, tendo, portanto, acesso à essas informações. As compras, em sua maioria, eram realizadas por telefone, passando-se ele por outra pessoa para retirar os livros após confirmada a venda pela administradora do cartão. Com o tempo os prejuízos começaram a ser sentidos pelos livreiros, chegando o assunto até Ken Sanders, dono de uma livraria de livros raros, que iniciou verdadeira caçada para pegar o ladrão.
A autora teve contato próximo tanto com Sanders como Gilkey, que foi entrevistado por ela várias vezes, narrando seu amor aos livros e sua paixão compulsiva para os ter em sua biblioteca particular. Gilkey, porém, não almejava lucro por meios dos roubos, apenas vendendo os exemplares nas situações em que precisava de dinheiro. Em uma das entrevistas concedidas, Gilkey disse: "- Quando se tem uma estante de livros (...) com quanto mais livros você a ocupa, com mais livros irá querer enchê-la. E quanto mais valiosos forem os livros, mais bonita ficará a estante. {...} Uma estante cheia de livros é um objeto cheio de beleza: você pode ler os livros, se quiser. Mas, por si mesma, a estante irá contribuir para a ambientação da casa, não é verdade? E ela só irá ganhar valor, com o passar do tempo. Você não acha que toda casa deveria ter uma estante de livros? Ainda que fosse apenas pelo prazer de... Imagine que você tenha de receber alguém que jamais tenha visto antes, e que possa levar essa pessoa a um canto da casa e dizer: 'Esta é a minha biblioteca'" (pág. 53).
Gilkey, porém, ultrapassou "o limite entre a cobiça e o roubo" (pág. 83). Sua biblioteca não poderia ser mostrada para nenhuma pessoa, ainda mais para aqueles que entendessem de livros raros, visto que a maioria absoluta de seus exemplares era objeto de furto. Dessa forma, "por mais que ele desejasse exibir suas aquisições, o próprio ato de exibi-las resultaria na perda das mesmas. Tão logo Gilkey adicionasse um livro à sua coleção, este se tornaria exclusivamente objeto de um prazer privado, que jamais poderia ser compartilhado com ninguém" (pág. 167). Ao armazená-los em sua própria casa, podendo assim gozar da companhia dos mesmos, cometeu um grande erro, podendo assim ser identificado pelos policiais que estavam em seu encalço, os quais até então apenas dispunham apenas das informações que lhes eram repassadas por Sanders.
Preso em diversas oportunidades, seja por estelionato ou roubo, Gilkey sempre cumpria suas penas e voltava a cometer seus delitos literários. Atualmente continua a ser procurado por Sanders, o "bibliodetetive". Leitores, porém, fiquem tranquilos. Dificilmente ele aparecerá por essas terras tupiniquins!
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