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"No Mundo dos Livros", José Mindlin

A LEITURA COMO EXEMPLO

MIDLIN, José. No Mundo dos Livros, Rio de Janeiro: Ed. Agir, 2009, 103 pág.

O famoso escritor argentino JORGE LUIS BORGES dizia que sempre imaginou o paraíso como uma grande biblioteca. Acredito que para o bibliófilo e membro da Academia Brasileira de Letras, José Mindlin, essa premissa deva ser verdadeira.

“No Mundo dos Livros” é uma declaração de amizade. Em ritmo de conversa, o autor nos apresenta como iniciou sua famosa biblioteca, uma das maiores da América Latina e cujo acervo referente a história do Brasil foi doado para a Universidade de São Paulo e aguarda a construção de um prédio para abrigar todos os exemplares. O autor ainda lança pequenos lampejos de sua infância e tempos de acadêmico de direito, relatando seu contato com grandes escritores da época como Monteiro Lobato.

No entanto, deixa claro que seu maior interesse sempre foi pela leitura, sendo voraz o seu apetite nesse campo. Assim, desde cedo se familiarizou com os grandes clássicos universais, não esquecendo, todavia, da importância da literatura nacional para sua formação intelectual e cultural.

A conversa, pois a leitura do livro assim se apresenta, no entanto, mais impressiona pela empolgação do autor ao falar sobre o prazer da leitura, não sendo poucas as vezes que Mindlin se desculpa por não ter tempo para abordar todos os assuntos com mais vagar. Nesse particular reside a parte mais fascinante da leitura, qual seja: o exemplo dado por um bom leitor.

Gosto de falar de livros e discutir leituras com amigos e conhecidos, ainda que muitos não tenham o hábito de ler. Fico animado quando algum deles apresenta curiosidade pelo que estou falando. Tenho que um dos maiores incentivos para novos leitores é o contato com aqueles que conhecem literatura e gostam de falar sobre ela. Caso possam fornecer dicas de leituras e dados sobre a vida dos escritores, melhor ainda. Todos aqueles que se interessam por livros ficam maravilhados em ter contato com escritores e costumam partir dessas conversas querendo devorar livros e mais livros. Infelizmente, aqui nesse nosso rincão, poucos são os autores que se prontificam a conversar, sendo que muitos deles, especialmente aqueles que se julgam de primeira estirpe, preferem o isolamento e até se mostram arredios ao contato com seus leitores.

Tal fato, porém, nada deve representar, pois, segundo Montesquieu, “nunca tive um dessabor que uma hora de leitura não aliviasse”.

Assim, fica o incentivo para a leitura, para novas descobertas e encontros. Não precisa necessariamente ser um clássico, um monstro sagrado, mas um livro que lhe agrade, que lhe dê prazer. Dessa forma, encerro essa singela resenha citando Varlam Chalámov, escritor russo falecido em 1982, que assim dizia:

“Os livros são como pessoas; eles podem decepcionar ou envolver. Na vida de qualquer homem alfabetizado há sempre um livro que desempenhou um importante papel em seu destino. Frequentemente não se trata de uma obra de um gênio reconhecido, mas de um ordinário romance de um modesto escritor.”

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